No ano em que se comemoram os 50 anos da Revolução de Abril e se assinala o centenário do nascimento do líder do PAIGC Amílcar Cabral, sócios e amigos da URAP, participaram, entre 13 e 20 de Outubro, numa viagem de Resistência e Lazer a Cabo Verde, visitando as ilhas de Santiago e do Fogo.
O grupo, constituído por 36 pessoas, entre as quais o coordenador da URAP, José Pedro Soares, os membros do Conselho Directivo Carlos Mateus e José Baguinho, e o membro do Conselho Nacional Carlos Lopes Pereira, deslocou-se, na manhã do dia 18, ao Campo de Concentração do Tarrafal, em Chão Bom, ilha de Santiago.
No campo existe, desde 2000, o Museu da Resistência - que contém painéis informativos e fotos sobre as funções que possuíam os vários edifícios, e com todos os nomes dos presos - em memória dos 340 antifascistas portugueses que ali estiveram encarcerados entre 1936 e 1954, 32 dos quais morreram, e mais tarde dos 230 detidos cabo-verdianos, guineenses e angolanos dos movimentos de libertação, entre 1961 e 1974. O campo só seria fechado a 1 de maio de 1974.
No dia 15, na Cidade da Praia, o grupo visitou a Fundação Amílcar Cabral, presidida por Pedro Pires, ex-Presidente da República, ex-primeiro-ministro de Cabo Verde, e igualmente ex-comandante de brigada do PAIGC na guerra colonial, hoje com 90 anos. Ainda nesse dia, o grupo deslocou-se ao Monumento de Homenagem a Amílcar Cabral.
A fundação encontra-se a tratar a volumosa obra literária de Amílcar Cabral, fundador e secretário-geral do PAIGC, um dos maiores revolucionários africanos do século XX, visando o seu reconhecimento como Património Literário da UNESCO. Na Casa-Museu está documentada a vida de Cabral desde a sua formação académica em Lisboa.
O Campo de Concentração do Tarrafal começou a funcionar em 29 de Outubro de 1936, recebendo os primeiros 152 presos políticos, muitos participantes no 18 de Janeiro de 1934 e na Revolta dos Marinheiros.
A “colónia penal para presos políticos e sociais no Tarrafal”, também conhecida como “Campo da morte lenta”, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 26.539, de 23 de Abril de 1936, e tinha como objectivo afastar os mais “problemáticos” e perigosos resistentes, e, com as duras condições do clima e do encarceramento, demonstrar que a repressão seria levada ao extremo (maus tractos, torturas, trabalhos forçados, alimentação escassa e falta de assistência médica).
Recorde-se que o médico de serviço do campo, Esmeraldo Pais, afirmou mesmo: “não estou aqui para curar, mas para assinar certidões de óbito”.
O campo, classificado como Património Cultural Nacional em 2006, preserva as suas características originais, encontrando-se em bom estado de conservação, e é visitado por portugueses e estrangeiros, numa média de mil visitas mensais.
Muito próximo do Campo de Concentração situa-se o Cemitério Municipal do Tarrafal, que o grupo visitou, dando particular atenção ao talhão onde se encontram as lápides dos 32 antifascistas portugueses que morreram no Campo de Concentração, e cujos restos mortais foram trasladados para o Cemitério do Alto de São João, em Lisboa, em 18 de Fevereiro de 1978, e se encontram num memorial ali erigido por subscrição pública.
O cemitério encontra-se em bastante mau estado, e esse foi um dos temas de conversa na reunião que ocorreu na tarde do dia 18 na Câmara Municipal de Tarrafal, na qual a delegação da URAP, composta por José Pedro Soares, coordenador, pelos membros do Conselho Directivo, Carlos Mateus e José Baguinho, e por Carlos Lopes Pereira, do Conselho Nacional, foi recebida pelo vice-presidente da autarquia, Arnaldo Andrade Ramos, Samora da Luz Moreira, director de Gabinete do presidente, e outros dois vereadores.
A mesma delegação da URAP havia reunido anteriormente na Cidade da Praia com o presidente da Fundação Amílcar Cabral, Pedro Pires, e outros membros da direcção, informando-os sobre os objectivos da organização e o trabalho realizado na defesa da memória da resistência e dos crimes do fascismo, do posicionamento pelo desarmamento e pela Paz, contra as repetidas agressões do imperialismo e contra a ascensão das forças da extrema-direita e fascizantes, que os interlocutores consideraram serem preocupações comuns.
A URAP ofereceu à fundação um conjunto dos livros já editados sobre a resistência antifascista e as cadeias do fascismo em Portugal. A Fundação lamentou, por seu lado, não ter meios para a recolha e escrita das memórias da luta contra o colonialismo.
Na conversa com Arnaldo Andrade Ramos, vice-presidente da Câmara Municipal do Tarrafal, este referiu o estado do cemitério que se deve a dificuldades orçamentais que enfrenta para a sua requalificação, e informou que no âmbito da geminação da Cidade de Tarrafal com o Município de Grândola, esta se comprometeu a elaborar um projecto para a requalificação do talhão dos portugueses.
A delegação da URAP manifestou disponibilidade para contribuir para a sua concretização, através de posterior contacto com a Câmara Municipal de Grândola. Foram oferecidos alguns dos livros editados pela URAP e referido que a URAP pretende regressar a Cabo Verde e ao Tarrafal em 2026, por ocasião dos 90 anos da abertura do Campo de Concentração, intenção bem aceite pelo executivo camarário.
No dia 17, o grupo atravessou a ilha de Santiago pelo interior, o que proporcionou apreciar magníficas paisagens de montanha, com grandes penhascos e vales encaixados, em vários tons de verde, face à ainda recente época das chuvas, em que predominam plantações de milho e abóbora, espaços salpicados por pequenas aldeias e casario disperso.
Após uma paragem em Assomada, vila importante no centro da ilha, com uma temperatura sempre acima de 30 graus e muita humidade, o grupo entrou na Cidade de Tarrafal, bem junto ao mar, com belas praias e actividade piscatória artesanal.
No dia 19, o grupo regressou à Cidade da Praia pela estrada da costa oriental da ilha, tendo antes visitado, no interior, o Parque Natural da Serra da Malagueta e a barragem de Principal, no lugar de Chão da Horta.
Na Cidade da Praia, onde o grupo permaneceu dias 14 e 15, deslocou-se ao enorme mercado de Sucupira e teve tempo livre para compras e praia. Vinte companheiros seguiram para a Ilha do Fogo, nomeadamente para o Parque Natural do Fogo, paisagem de impressionante vulcanismo, cuja última erupção ocorreu em 2014.
Os visitantes observaram a produção de um vinho de excelente qualidade, o Chã, produzido a partir de vinhas que crescem inclusivamente entre a rocha vulcânica.
No dia 16, estiveram na chamada Cidade Velha, na Ribeira Grande de Santiago, a primeira localidade da Ilha de Santiago na qual aportaram os exploradores portugueses e em cuja pequena praça central ainda figura o pelourinho original onde se realizava o mercado de escravos.
Esse dia terminou com um jantar e música ao vivo num restaurante no Plateau, a zona comercial da Cidade da Praia. Na Cidade de Tarrafal, dia 17, contactaram com a Câmara Municipal do Tarrafal. Os sócios e amigos da URAP regressaram a Lisboa no final da manhã de dia 20.