No
dia 4 de Outubro, a URAP organizou uma visita ao forte de Peniche,
principal prisão politica do regime de Salazar. O reencontro de
vários participantes no Comboio dos 1000 - que teve
lugar no mês de Maio - e ao qual se juntaram muitos outrso jovens serviu o objectivo de estabelecer relação
entre a história da ascensão do nazi-fascismo na Europa, e a
história concreta do nosso país, cujo regime fascista foi o mais
prolongado da Europa.
O
grupo foi constituído por mais de uma centena de jovens,
provenientes da Escola Secundária Fernão Mendes Pinto de Almada,
Escola Secundária Alfredo dos Reis Silveira do Seixal, Escola
Secundária Soares Basto e Escola Ferreira de Casto, ambas de
Oliveira de Azeméis. Participaram ainda jovens de diversas
Associações participantes no Comboio dos 1000.
Chegados
a Peniche, e depois de uma breve apresentação com a presença de
Rui Venâncio, da Câmara Municipal de Peniche, e de António José
Correia, Presidente da Câmara Municipal, os participantes foram
divididos em quatro grupos, que foram respectivamente acompanhados
por um ex-preso politico na visita ao forte. Os ex-presos políticos
presentes foram Álvaro Pato, José Ernesto Cartaxo, José Pedro
Soares e Manuel Pedro.
A visita foi organizada de forma a permitir a passagem em nos principais quatro sítios do forte: o recreio, o Redondo onde funcionava o "Segredo", o Parlatório e as Celas.
Começaram por ser relatadas as condições de vida dos presos políticos: dado que Peniche era uma prisão exclusivamente política, todos os presos que lá chegavam, com raras excepções, tinham já sido condenados. Antes da condenação antecediam-se longos períodos de interrogatórios e torturas, por isso era comum os presos chegarem em condições de saúde muito adversas, agravadas pelas duras condições prisionais.
Os
presos passavam a maior parte do tempo encarcerados em celas ou
salas. As celas eram individuais, as salas podiam comportar de 1 a 10
pessoas. O recreio, nome dado ao pátio entre os blocos de celas, era
o único local onde os presos podiam estar ao "ar-livre", apenas
1 hora por dia. Esta circulação era atentamente vigiada pelos
carcereiros, as conversas tinham que ser em tom audível e era
proibido falar de questões políticas ou de outros presos políticos.
Outro
dos locais visitados foi o Redondo, conhecido entre os presos como
"Segredo". Aqui, existiam pequenas celas totalmente escuras, onde
os presos eram colocados isolados, como forma de castigo, muitas
vezes arbitrário. Foi daqui que se deu a espantosa evasão de Dias
Lourenço. Foi salientado que a luta interna era feita em articulação
com a luta clandestina fora da prisão, e as evasões tinham como
principal objectivo o regresso à luta organizada.
Não obstante as condições sub-humanas e a repressão exercida sobre os presos, a capacidade organizativa dos resistentes anti-fascistas dentro do Forte, muitas vezes acompanhada pelo protesto das famílias no exterior e junto de várias entidades conseguiram, ao longo dos anos, melhorar as suas condições na prisão, nomeadamente conquistando o direito ao aumento do número de visitas, acesso a livros e jornais, bem como à possibilidade de ter visitas em comum pelo Natal e no dia do aniversário.
Sem
ser nesses períodos, todas as visitas eram feitas no Parlatório,
uma zona constituída por cubículos, onde o preso ficava sempre
separado dos visitantes por vidros e grades. Estas visitas eram
sempre vigiadas por um guarda, e à mínima tentativa de troca de
informações consideradas suspeitas, era-lhe imediatamente colocado
um fim.
A
visita ao Parlatório contou com o importante testemunho de Eulália
Miranda e Silvina Miranda, filhas do ex-preso político Dinis
Miranda. Desde muito novas, com 8 e 4 anos, respectivamente, passaram
a visitar o seu pai preso. Este foi um importante testemunho, pois
permitiu estabelecer contacto com outra face cruel da ditadura
fascista: a privação imposta às famílias dos resistentes que
assim se viram friamente separadas. Esta separação tentava ser
atenuada com o envio de histórias e desenhos, que os pais enviavam
aos seus filhos, esperando respostas que pudessem fazer as vezes do
contacto que lhes era negado.
Na
visita às celas, a guia do museu contou mais detalhadamente a
história das fugas de Álvaro Cunhal e seus camaradas, e Dias
Lourenço, consideradas as principais fugas do forte. As celas,
conservadas e com a recriação de algumas cenas do quotidiano,
permitiram ter noção das condições de vida dos presos, que ainda
assim conseguiam desenvolver actividades artesanais e intelectuais,
do qual são exemplo os desenhos da prisão, de Álvaro Cunhal,
expostos numa das celas.
No
final da visita, foi exibido o filme dos Comboio dos 1000, elaborado
por Bruno Vassalo, que permitiu recordar os vários momentos da
viagem.
Seguiu-se um momento de convívio em forma de pic-nic, onde
houve ainda espaço para a declamação de poesia por parte dos
alunos da Escola Secundária Alfredo dos Reis Silveira.Também José Pedro Soares e Marília Villaverde Cabral dirigiram umas breves palavras aos participantes em nome da URAP.
Esta
viagem constitui um importante momento para o aprofundamento do
conhecimento da história do nosso país, vontade identificada
aquando a viagem do Comboio dos 1000. O facto de ter havido um
acompanhamento por parte dos ex-presos políticos, constituiu um
elemento fundamental, porque permitiu aos jovens um contacto
privilegiados com a história, na primeira pessoa. Espera-se assim
que todos os jovens presentes tenham ficado ainda mais motivados para
a luta antifascista e pela defesa da democracia que todos os
ex-presos, com a sua luta e sacrifício, conquistaram. Esta é a
melhor homenagem que lhes pode ser feita.