Notas de Carlos Machado dos Santos, militar de Abril, da sua intervenção no convívio de ex-presos e amigos em defesa do Forte de Peniche
Comecei por saudar os presentes e dar a conhecer os motivos por que ali estava a intervir: primeiro, porque tinha sido convidado pela URAP, o que muito me honrava, embora, se tal não acontecesse, tencionaria estar, na mesma, presente;
depois, por razões racionais, ideológicas e morais, porque condenava a intenção inadmissível do Governo em alienar a privados, com diversos fins, vários edifícios do património nacional, designadamente o Forte de Peniche, símbolo da resistência ao fascismo e dos sacrifícios de milhares de pessoas na luta contra a opressão;
por outro lado, por razões sentimentais, justificadas pelo facto de ter sido um dos dois militares de Abril encarregados de proceder à libertação formal dos presos políticos no Forte, nesse glorioso 25 de Abril de 1974.
Fiz, então, uma breve resenha das dificuldades que se nos depararam para levar a bom termo essa missão, dados os obstáculos que o General Spínola, então chefe e militar formal do Movimento, colocava em libertar, incondicionalmente, os presos políticos quer em Caxias quer e, principalmente, em Peniche.
Narrei um ou dois episódio trágico-caricatos que antecederam a nossa chegada a Peniche e que justificaram todo o atraso no processo de libertação, que levou a que o primeiro preso apenas saísse em liberdade ao primeiro minuto do dia 27 de Abril; precisei que, apesar das dificuldades encontradas, a nossa missão conseguiu ser levada a bom termo.
Concluí que, apesar disso, nunca considerei que tivesse praticado um acto heróico, outrossim um dever cívico e de plena justiça, que me ajudou a elevar a auto-estima como Militar e como Cidadão, a ponto de valorizar esse dia como o mais significativo da minha vida.
Terminei agradecendo a todos os presentes e desejando-lhes força e determinação na actual luta em contrariar e, seguramente, anular as intenções do Governo sobre o destino desta Fortaleza.