por Luís Farinha, historiador
Os diferentes usos que os indivíduos e grupos fazem do passado são indiciadores da coexistência de memórias concorrentes, alvo de disputas e de conflitos, como de um campo político e cultural em constante reconstrução se tratasse. Nesse sentido, a consensualização da memória, mais do que um combate pelo futuro é antes uma espécie de pacificação sobre um tempo infrutífero e morto.
A memória do «5 de Outubro» não foi nunca uma memória consensual, antes se manifestou sempre como alvo de disputas e de conflitos. No regime fascista, a data era comemorada anualmente pelas oposições democráticas para combater a ditadura e para exigir a libertação dos presos políticos e a reposição das liberdades públicas e da democracia. A estas manifestações democráticas correspondia o regime com repressão, mais prisões e sessões públicas onde se evocava a Primeira República como um regime opressivo, libertário e sanguinolento.
Não terá sido por acaso que, em 2013 – três anos depois das Comemorações do I Centenário da República –, o governo e o Presidente da República da altura se conjugaram para acabar com o feriado do 5 de Outubro, num dos períodos mais negros da história do país, sujeito a uma política excecional de restrições dirigida pelos grandes centros financeiros internacionais de comando económico e político.